Saturday, December 18, 2010

18 - Um início de livro que você gosta


Esse eu confesso que foi bem difícil escolher. Gosto muito da dedicatória de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", mas como já citei esse livro, resolvi buscar outros.

Venho compor esse tópico com um dos primeiros livros espíritas que li: "Laços Eternos", de Zíbia Gaspareto.

Meu receio da morte, medo de perder as pessoas que amo ou me afastar delas, me levaram a buscar esses livros. E é estranho que uma pessoa que realmente tem pavor do assunto goste de um início de livro com a morte de uma garota de apenas 14 anos.

Justifico: o tipo de narrativa e a mensagem de esperança e cura, mostrando que a morte não é o fim de tudo e sim apenas uma passagem amenizam bastante o meu assombro.

Por isso em meio a tantas opções, decidi que esse tópico traria meu maior medo acolhido pelas palavras que confortam e mostram outras possibilidades de Vida.


"É noite. Tudo caminha em plácido silêncio. Na aurora cálida do amanhecer, só a pipilar das aves notívagas parecem dar um sopro de vida à paisagem sombreada da Terra.
Em uma janela, às escuras, um vulto quieto observa o estertorar silencioso da
noite que se finda e a dealbar da alvorada iniciante.
Seu rosto é pálido sob a luz diáfana da madrugada; seu corpo franzino procurando enxergar o rumo, descobrir os primeiros raios de luz que desenharão a verdadeira estrada.
Soluços angustiados quebram a quietude fresca da aurora. O corpo franzino
apoiado ao peitoril sacode-se ritmicamente, embalado pela dor em clavas de angústia.
Lenço à boca, a tosse aponta sufocante. A pureza do branco tinge-se de
vermelho e o sangue quente em golfadas insopitáveis mancha a camisola pura.
O magro corpo jovem, num esforço hercúleo procura erguer-se e fitar o céu, em derradeiro esforço. Seus olhos encovados, abertos, procuram ainda indagar o porquê de tanta dor nos seus quatorze anos.
Lentamente, como flor que se abate frente à tempestade, a figura pálida desfaleceu e seu corpo deslizando rente à janela, pendeu para o chão, mas sua cabeça, recostada no espaldar, conservou-se voltada para o dia que nascia. Os olhos continuaram abertos, ainda que enevoados. Pareciam indagar dos mistérios profundos que separam a vida da morte.
Após alguns minutos, uma emanação radiante desprendeu-se do corpo hirto, adensando-se, corporificando-se em perfeita réplica da jovem estendida. Como se por autêntico milagre, de gigantesca potência, ela se tivesse multiplicado.
Surpreendida, a forma radiante e translúcida, olhou para o corpo que acabava de
deixar. Seu semblante denotava piedade e amor.
Sentia-se leve e saudável. Porém, quando olhava para o corpo inerte, um vivo sentimento de piedade a invadia; parecia-lhe momentaneamente regressar ao jugo de pesadas cadeias de uma prisão aniquilante. Num desejo instintivo de libertação, procurou afastar-se dele."

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